quarta-feira, 13 de julho de 2011

Hipóteses reconhecidas de direito subjetivo à nomeação


Aprovação em concurso público (segunda parte) – hipóteses reconhecidas de direito subjetivo à nomeação


Em meados da década de 90, revendo sua própria interpretação de que somente há direito à nomeação em caso de preterição de vaga, o STF tornou-a mais abrangente, conforme demonstra ementa a seguir transcrito, reconhecendo este direito também quando a Administração Pública houver nomeado, para mesmo cargo ou funções, pessoa não aprovada em concurso público.

CONSTITUCIONAL - ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - CONCURSO PÚBLICO - DIREITO A NOMEAÇÃO - SÚMULA 15 - STF - A aprovação em concurso não gera direito a nomeação, constituindo mera expectativa de direito. Esse direito somente surgirá
se for nomeado candidato não aprovado no concurso ou se houver o preenchimento de vaga sem observância de classificação do candidato aprovado. Súmula 15-STF”
(STF - MS 21.870 - DF - T.P. - rel. Min. Carlos Velloso – DJU 19/12/1994).

Este foi o marco inicial para a re-análise do conceito de discricionariedade e seus limites em relação à nomeação para cargos públicos de candidatos aprovados em concurso público.
Não se desconhece que, essencialmente, a decisão sobre nomeação depende de análises administrativas inseridas no campo da discricionariedade, mediante a avaliação de conveniência e oportunidade, bem como de recursos orçamentários disponíveis para fazer frente a esta despesa.
Também não se pretende negar que o Administrador Público deve ter, dentro dos limites legais, liberdade para gerir a máquina pública, podendo eleger prioridades que se adequam aos fins de maior urgência ou relevância para o Estado, e com isto podendo reduzir ou aumentar a quantidade pretendida de servidores em determinados cargos ou funções, o que resulta, com isto, no poder de não contratar candidatos aprovados em concurso. Portanto, continuam estes detendo apenas expectativa de direito quanto à nomeação.
Em tempos mais recentes, os órgãos judiciais pátrios, na esteira da evolução conceitual de Poderes Vinculado e Discricionário, vêm aumentando o rol das situações nas quais a nomeação deixa de ser ato discricionário para tornar-se vinculado, retirando do Administrador Público a faculdade de optar pela não realização de nomeação quando presentes alguns requisitos ou quando existentes algumas situações.
Além das circunstâncias mencionadas ao início, reconhecem-se hoje também outras hipóteses nas quais passa a haver direito subjetivo à nomeação, conforme demonstram ementas de julgados do Supremo Tribunal Federal.


"FUNCIONÁRIO PÚBLICO. Cargo. Concurso. Aprovação. Não nomeação. Prova da necessidade de pessoal. Direito subjetivo à nomeação reconhecido. Mandado de segurança concedido. Provimento ao recurso ordinário para esse fim. Precedentes. Se a administração pública, tendo necessidade de pessoal, requisita servidores, em vez de nomear candidatos aprovados em concurso cujo prazo de validade ainda vige, ofende direito subjetivo dos aprovados à nomeação, segundo a ordem em que se classificaram."
(RMS 458-RJ. Min Relator Cezar Peluso, STE, 30/03/2007)

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: CONCURSO PÚBLICO. DIREITO À NOMEÇÃO. SÚMILA 15-STF. I. – A aprovação em concurso público não gera, em princípio, direito à nomeação, constituindo mera expectativa de direito. Esse direito surgirá se for nomeado candidato não aprovado no concurso, se houver o preenchimento de vaga sem observância de classificação do candidato aprovado (Súmula 15-STF) ou se, indeferido pedido de prorrogação do prazo do concurso, em decisão desmotivada, for reaberto, em seguida, novo concurso para preenchimento de vagas oferecidas no concurso anterior cuja prorrogação fora indeferida em decisão desmotivada. II. – Precedentes do STF: MS 16.182/DF, Ministro Evandro Lins (RTJ 40/02); MS 21.870/DF, Ministro Carlos Veloso, DJ de 19.12.94; RE 192.568/PI, Ministro Marco Aurélio, “DJ” de 13.09.96; re 273.605/sp, Ministro Néri da Silveira, “DJ” de 28.06.02. III – Negativa de seguimento ao RE. Agravo não provido.”
(RE-Agr 41.9013/DF – Distrito Federal – Ac. 2ª T, Rel. Min. Carlos Velloso, dju 25.06.2004, P. 59)

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO: CADASTRO DE RESERVA. CANDIDATO APROVADO: DIREITO À NOMEAÇÃO. ATO OMISSIVO. VALIDADE DO CONCURSO. PRAZO DECADENCIAL. TERMO INICIAL. 1. Candidatos aprovados em concurso público e classificados além do número de vagas originalmente previsto no edital de convocação. Inclusão no cadastro de reserva destinado ao preenchimento de cargos que viessem a ficar vagos no prazo de sua validade. Conseqüência: direito subjetivo à nomeação, durante o lapso assinalado no respectivo edital, caso se verifiquem as condições legais veiculadas para o ato. 2. Ato omissivo consistente na não-nomeação de candidatos aprovados em concurso público. Alegação insubsistente, dado que não se pode reputar omisso o administrador que, em razão do término da eficácia jurídica do concurso, não mais detém autorização legal para a efetivação do ato requerido. 3. Mandado de Segurança impetrado após decorridos cento e vinte dias do ato omisso reputado ilegal. Decadência (Lei 1533/51, artigo 18). Recurso ordinário em mandado de segurança não provido.”
(RSM 24.119-DF. Min. Relator Maurício Corrêa. STE, 30/02/2002)

Posicionamento ainda mais avançado tem o Superior Tribunal de Justiça, que consagrou posicionamento de que, para os aprovados dentro do número de vagas, há que se falar em direito líquido e certo à nomeação, e não em mera expectativa de direito, conforme demonstra ementa abaixo.

ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - CONCURSO - APROVAÇÃO DE CANDIDATO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS EM EDITAL - DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO E À POSSE NO CARGO - RECURSO PROVIDO.
1. Em conformidade com jurisprudência pacífica desta Corte, o candidato aprovado em concurso público, dentro do número de vagas previstas em edital, possui direito líquido e certo à nomeação e à posse.
2. A partir da veiculação, pelo instrumento convocatório, da necessidade de a Administração prover determinado número de vagas, a nomeação e posse, que seriam, a princípio, atos discricionários, de acordo com a necessidade do serviço público, tornam-se vinculados, gerando, em contrapartida, direito subjetivo para o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas em edital.
Precedentes.
3. Recurso ordinário provido.”
(RMS 20.718/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 04.12.2007, DJ 03.03.2008 p. 1)

No voto-vista do Ministro NILSON NAVES, proferido no julgamento supra-mencionado do RMS 20.718/SP, esclarece-se o fundamento para este entendimento, “porque a mim sempre se me afigurou que o concurso representa uma promessa do Estado, mas promessa que o obriga, é claro – o Estado se obriga ao recrutamento de acordo com o número de vagas.”
Esta mesma questão encontra-se também sendo debatida na corte constitucional brasileira, conforme nos elucidam Gilmar Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gonet Branco1, em sua recente obra “Curso de Direito Constitucional”, segundo quem: “...encontra-se pendente de julgamento o Mandado de Segurança n. 24.660, Rel. Min. Ellen Gracie, no qual a Corte enfrenta a questão do direito à nomeação de candidata aprovada em concurso público de provas e títulos para o cargo de Promotora da Justiça Militar, se existente cargo vago durante o prazo de validade do concurso. A Ministra relatora, Ellen Gracie, entendeu que não havia cargo vago à época da impetração da segurança, denegando o pedido, mas a Ministra Carmem Lúcia, no que foi acompanhada pelo Ministro Sepúlveda Pertence, abriu divergência afirmando a existência de vagas e a ilegalidade do ato omissivo do Poder Público, que não procedeu à devida nomeação. Atualmente os autos encontram-se com vistas ao Ministro Gilmar Mendes.”
Todavia, tratando das demais situações, os mesmos autores2 explicam que:
Na ADI 2.931, relator Carlos Britto, DJ de 29-9-2006, discutiu-se o direito objetivo à nomeação, firmando-se as seguintes teses: 1) é reconhecido o direito de o candidato, aprovado em concurso público, ser recrutado segundo a ordem descendente de classificação de todos os candidatos (tendo em vista que o sistema é de mérito pessoal) durante o prazo de validade do respectivo edital de convocação (que é de 2 anos, prorrogável apenas uma vez, por igual período); 2) também é reconhecido o direito de precedência que os candidatos de concurso anterior têm sobre os candidatos aprovados em concurso imediatamente posterior, desde que não escoado o prazo de validade do primeiro certame; 3) os direitos anteriormente reconhecidos estão sob o crivo da oportunidade e conveniência (poder discricionário) da Administração Pública de nomear os candidatos que se encontram naquelas condições (precedente: RE 229.450, relator Maurício Corrêa, DJ de 22-5-2000).”

Portanto, as situações que hoje o Poder Judiciário preponderantemente reconhece que a expectativa de direito se transforma em direito subjetivo de nomeação para o candidato aprovado em concurso público são:

1 – Quando ocorrer nomeação de um candidato em detrimento de outro melhor classificado, ou quando ocorrer nomeação, para o mesmo cargo, de pessoa não aprovada em concurso público;
2 – Quando houver candidato aprovado em um concurso público e a Administração Pública promulga edital de novo concurso, para o mesmo cargo efetivo ou emprego público, e realiza nomeação de candidato aprovado no concurso mais recentemente realizado, ignorando o candidato aprovado do concurso anterior que ainda se encontre em seu prazo de validade;
3 – Quando houver concurso público para formação de cadastro de reserva para preenchimento de vagas que eventualmente venham a surgir durante o prazo de validade do concurso, quando efetivamente surgirem tais vagas;
4 – Quando houver candidato aprovado em concurso público e a Administração Pública, ao invés de nomeá-los, contrata ou mantém contratado funcionários terceirizados, contratados temporários ou requisitados exercendo exatamente a mesma função ou cargo para os quais foi realizado aquele certame;
5 – Relativamente ao candidato aprovado e classificado dentro do número de vagas previstas no edital, consagrando revisão de posicionamento anterior, tornando aplicável à Administração Pública, relativamente à concursos públicos para os quais haja oferecimento de vagas determinadas, o conceito de que aquele unilateralmente realiza promessa, vincula-se àquele que atende ao que foi prometido, ao mesmo tempo reconhecendo a aplicação subsidiária a concursos públicos do abaixo transcrito art. 49 da Lei nº8.666/91 (Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos).
Art. 49. A autoridade competente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado.

Percebe-se que houve, durante a última década, uma substancial alteração jurídica sobre a determinação dos efeitos de uma aprovação em concurso público, a qual é vista hoje como, em inúmeras situações, geradora de Direito Subjetivo à Nomeação, e não mais de apenas Expectativa de Direito.

Notas de rodapé
1MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires & BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2008.
2MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocêncio Mártires & BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Ob cit.

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Revista Jus Vigilantibus, Terça-feira, 19 de agosto de 2008

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